Hoje em Coimbra, amanh� em Lisboa, depois de amanh� no Porto. Depois do SET de 03, Kimmo Pohjonen regressa com Samuli Kosminen para voltar a apresentar o projecto “Kluster”. Apertem os cintos, protejam-se. A sess�o de “wrestling” de acorde�o vai come�ar.
Kimmo Pohjonen �, actualmente sin�nimo de ebuli��o e revolu��o musical oriunda de um prol�fico norte � beira do B�ltico, que j� nos deu a conhecer tantos projectos que extravasam a folk, como os ateus Hedningarna, as fugazes V�rttin�, a contestat�ria sami Mari Boine, ou o electro yoiker Wimme Saari. Ambos constituem uma pequen�ssima ponta de um extenso iceberg da efervesc�ncia musical que se vive em muitas aldeias / vilas n�rdicas onde n�o tocar um instrumento ou n�o cantar, o que quer que seja, � uma anormalidade. A velha hist�ria volta a repetir-se. Kimmo Pohjonen �, � semelhan�a de tantos outros m�sicos folk, uma individualidade que nasceu em ber�o de m�sicos tradicionais (o seu pai era acordeonista) numa aldeia musical � Viiala � que est� para o fole crom�tico, como as aldeias de Jarvella e de Kaustinen est�o para o violino e para o kantele (o instrumento nacional na Finl�ndia).
Apesar de ter apenas gravado e editado tr�s projectos em nome pr�prio (�Kielo� (98), �Kluster� (2002) e �Kalmut� (�2003�), Kimmo Pohjonen, em apenas seis anos, chegou a contribuir para a grava��o de mais de 65 �lbuns de m�sicos finlandeses dos mais diversos quadrantes: Heikki Leitinen (inevitavelmente), Maria Kalaniemi, Pinnin Pojat, a estrela de rock Alanko Saatio, o violinista Arto J�rvell�, etc, etc, etc. Lembro-me agora das palavras de Kari Reiman, violinista dos V�rttin� e antigo companheiro de Pohjonen nos Ottopasuuna (muito bons os dois �lbuns que este colectivo gravou, em especial �Suokaasua�), que toca habitualmente numa dezena de projectos ao mesmo tempo: �a �nica forma de um m�sico ser profissional na Finl�ndia � ter a possibilidade de tocar com muita gente�, de estar continuamente em palco. Actualmente, Pohjonen parece-me bem mais afastado da cena musical local, sobretudo daquela que privilegia o formato ac�stico, ou seja, do n�cleo duro que o nomeou como o m�sico folk finland�s mais inovador durante tr�s anos sucessivos (entre 96 e 98).
Kimmo Pohjonen amadureceu individualmente e tem continuado a desenvolver projectos paralelos com outros m�sicos provenientes do outro lado do Atl�ntico. Casos da KTU (Kluster Tu), simbiose entre o acordeonista-lutador-de-wrestling e Samuli Kosminen (que o acompanha no projecto que os portugueses v�o ter oportunidade de ver ao vivo nesta mini-digress�o de tr�s espect�culos), com Trey Gunn e Pat Mastelotto dos King Krimson, e da estreita colabora��o do mesmo projecto Kluster com a orquestra norte-americana Kronos Quartet.
Cortar com o passado
Dado o seu passado de estudante da Sibelius Academy no Departamento de M�sica Popular, orientado pelo alquimista Heikki Leitinen e, tendo tido a oportunidade de o entrevistar h� quase dez anos atr�s, quando ainda se encontrava no projecto Ottopasuuna, imp�e-se a seguinte quest�o: Considera-se hoje em dia ainda um m�sico folk, ou mais um m�sico experimental? Ao que Kimmo responde: �Penso que, de uma certa forma, nessa altura dos Ottopasuuna j� estava mais concentrado em procurar o meu pr�prio som, em fazer um trabalho inovador atrav�s da m�sica experimental. Penso que as ra�zes estavam l� e que, de uma certa forma, esse ser� sempre o meu �background�. Hoje estou mais interessado num certo tipo de som, de avant garde, de m�sica improvisada e de electr�nica. Quero explorar o acorde�o, a minha voz, quero criar sonoridades que nunca ouvi antes�.
O M�todo de ensino de Heikki Leitinen
Mas, o m�todo de ensino de Heikki Leitinen sempre foi inovador. Encoraja os alunos, primeiro, a absorverem a folk e, segundo, a tentarem desenvolv�-la, experimentando-a, improvisando com outros instrumentos e outras m�sicas, numa tentativa de alargar as fronteiras da m�sica popular. Nos anos 80, nasceram na Sibelius Academy projectos como as Niekku de Anna-Kaisa Liedes e de Maria Kalaniemi que experimentavam a folk e que fizeram com que Kimmo Pohjonen tivesse mudado do Departamento cl�ssico para o de m�sica popular. Entre a Academia de Sibelius Academy e o Instituto de M�sica Folk da aldeia de Kaustinen, muitos outros projectos inovadores foram tomando forma. Como, por exemplo, Suden Aika das vozes r�nicas de Tellu Virkkala, de Sanna-Kurki Suonio e de Liisa Matveinen (ex-Niekku). Int�rpretes que t�m colaborado sistematicamente com Heikki. �Penso que a influencia que o Heikki Leitinen tem no desenvolvimento da folk finlandesa � t�o grande que, tudo o que disse, � totalmente verdade�, afirma Kimmo Pohjonen. �Ele � uma esp�cie de guru para mim, sempre. Toquei em muitos projectos com ele e sempre fui muito influenciado por ele. Hoje em dia, estou um bocado afastado deste movimento, mas estarei sempre ligado afectivamente ao Heikki. � uma pessoa que nunca se pode subestimar.�
O que � que difere o seu trabalho de hoje em dia com o do passado e das suas m�ltiplas colabora��es com m�sicos folk? A abordagem mais electr�nica e experimental? �Hoje em dia, apenas tento improvisar o m�ximo poss�vel e, claro, inovar as ra�zes e a perspectiva cultural. Tentar por algo que seja meu. Tento explorar tamb�m o som, inventar novos sons, novas coisas. O mais importante para mim � mesmo explorar o som, encontrar novos n�veis, novas dimens�es. Tentar encontrar algo que n�o existe.�
No entanto, no trabalho de Kimmo, h� ainda muito ecos da tradi��o milenar da regi�o de Car�lia, sobretudo ao n�vel vocal. Os seus �mantras� parecem �spellings� das can��es r�nicas usadas para curar feridas, mordidas de cobras, ou mesmo problemas de amor. �� poss�vel�, considera Kimmo. �Ouvi muitas das cassettes com antigos poemas do Kalevala e material r�nico. � muito poss�vel que haja esse tipo de infu�ncia. No entanto, tento encontrar a minha pr�pria voz. De facto ouvi muito material vocal, mas o meu trabalho tanto pode soar a Finl�ndia, como a Tanz�nia, onde tive a oportunidade de estudar. Soa a mundo. Hoje em dia tento concentrar-me mais a criar o meu pr�prio som, na minha pr�pria voz�.
[continua]
(c) fotos: Rui Silva