Kepa Junkera & Sorgiñak – “Maletak”
Fol Musica (2016)
Há muito tempo que Kepa Junkera nos habituou a edições discográficas de luxo com um conceito bem definido. Ou seja, com uma boa história para contar e com uma super-produção para a materializar. Ainda, não há muito tempo, havia editado na Fol Musica dois livros / discos: “Galiza” (2013) numa belíssima reinterpretação de clássicos da folk galega (para além do profícuo diálogo entre repertório de ambas as regiões do norte da Península Ibérica) com um extenso rol de ilustres convidados, como Cristina Pato, Budiño, Leilía, Luar Na Lubre, Radio COS, Susana Seivane, Os Cempés, SonDeSeu, Treixadura, Uxia, Xabíer Díaz, entre muitos outros; e “Trikitixaren Historia Triki Bat” (2014) com o octeto de vozes e pandeiretas basco Sorgiñak que conta a pequena (grande) história da trikitixa (acordeão diatónico basco) e da pandeireta basca. Das raízes, dos estilos de tocar e dos intérpretes ao longo dos tempos.
Desta vez, “Maletak” tem como guião unificador dos 17 temas que atravessam o mais recente disco de Kepa Junkera a magia das malas onde são guardadas as trikitixas que o bilbaíno foi coleccionando ao longo de mais de 35 anos de carreira musical. Objectos (e verdadeiros passaportes) que «me inspiram e que me contam histórias que só elas podem conhecer», conforme refere Kepa Junkera no press-release.
“Maletak” poderia ser mais um álbum duplo, ao estilo de “Bilbao 00:00”, tal a extensa lista de convidados (mais de uma centena) de norte a sul de Espanha. É um disco de 74 minutos (no limite de espaço ocupado num CD normal) que une o virtuosismo de Kepa, a festa e a dança basca em estado bruto, o fluente diálogo entre o País Basco, Castela e Leão, Cantábria, Aragão, Galiza, Astúrias, Catalunha, Andaluzia e a Extremadura espanhola, os arranjos de uma folk progressiva, com algum xamanismo e etno-jazz nórdico, que parece ter encontrado o caminho da Urticária dos saudosos galegos Berrogüetto.
Em “Maletak” há frescura, força vocal e o calor humano das Sorgiñak (bruxas em euskara que poderiam interpretar, tal como as carelianas Värttinä, as canções rúnicas de feitiço retiradas da obra poética finlandesa Kalevala); mais percussões e aerofones bascos tocados por outros dois “monstros” da folk local: Ibon Koteron em alboka e Oreka TX nas txalapartas de pedra, de madeira e de bambu; boa gente na nova folk galega como Germán Diaz (sanfona), Pedro Lamas (saxofone com um certo toque do bom folk-jazz sueco dos anos 90 dos Den Fule) Daniel do Pando (berimbau de boca); guitarras espanholas bem “aflamencadas” de José Luis Montón e Josete Ordoñez; violino e mandolina do burgués (de Burgos) Diego Galáz (mestre na arte de interpretar instrumentos insólitos como o violino-trompete, violino-ukelele ou cordofones construídos com caixas de tabaco).
Mais uma superprodução que inclui um final apoteótico, à boa maneira dos Chieftains, com o tema-título “Maletak”. “Mashup” de jotas, seguidilhas, coplas que percorrem Galiza, Castela e Leão, Andaluzia, etc, com Eliseu Parra, Xabíer Díaz e as Adufeiras de Salitre, entre muitos outros a juntarem-se à festa. Enormes.