São os autores de quatro belíssimos álbuns, essenciais em qualquer lista que retrate o melhor de sempre produzido no arquipélago de Cabo Verde: ‘Raíz’ (1995), ‘Barro e Voz’ (1997), ‘Simentera’ (2000) e ‘Tr’adicional’ (2003). Há sete anos atrás, o colectivo dissolveu-se. Mário Lúcio, Tété Ahinho e Terezinha Araújo continuaram a gravar excelente música a solo. Este ano, o colectivo voltou a juntar-se e apresenta-se ao vivo em Serpa, no próximo dia 4 de Junho, no VII Encontro de Culturas.
As Crónicas da Terra recuperam uma entrevista com Mário Lúcio realizada em 2003, após o lançamento do último disco “Tr’adicional” e pouco tempo antes da dissolução do projecto.
MÁRIO LÚCIO, compositor e arranjador da Simentera, é peremptório em afirmar que este não é um colectivo constituído por “grandes músicos”. Ao invés são “músicos grandes”. É, de facto, notável o colectivismo destes cabo-verdianos, em que as individualidades se diluem num todo comum: “Quando assumimos a ideia de grupo, queríamos que houvessem nove músicos em palco e não apenas quatro. Cada um dos elementos toca vários instrumentos, canta como solista e faz coros. É um trabalho participativo desenvolvido ao longo dos anos. Queremos que todos desenvolvam as suas potencialidades e que, ao mesmo tempo, sejam uma unidade indissociável. Tivemos de fazer um trabalho mental, espiritual e técnico. Quando estamos em palco, há uma comunicação muito forte. Há tolerância e entre-ajuda, solidariedade. Se alguém falhar o outro está ali para cobrir”, revela Mário Lúcio.
Este é o espírito visível em todos as edições fonográficas dos Simentera. Sente-se que, Mário Lúcio ao fazer os arranjos, sabe bem o que quer: extrair toda a beleza serena e etérea dos diferentes ritmos e melodias de Cabo Verde (morna, coladera, funaná, samba local) e da delicadeza dos instrumentos acústicos, deixando para segundo plano quaisquer excessos de protagonismo de determinado solista. Nem os convidados que participaram no último disco “Tr’adicional” tiveram grandes honras de brilhar individualmente. Antes, foram integrados como mais um elemento dos Simentera.
’TR’ADICIONAL’, o quarto álbum, acentua o espírito colectivista dos Simentera. A ‘máquina’ encontra-se bem oleada. Por vezes, não sabemos quem está a cantar – será Tété Alhinho? Terezinha Araújo? Ou Maria de Sousa? Existe ainda um entendimento ímpar entre o grupo e os artistas convidados: o senegalês Toure Kunda, o camaronês Manu Dibango, o brasileiro Paulinho da Viola, para além de Maria João e Mário Laginha. Sem vedetismos em excesso, o mais importante para Mário Lúcio era o de “colocar estas estrelas a tocar como músicos dos Simentera”. Além disso, buscar aquilo que a história ofereceu de comum entre os representantes da uma cultura lusófona. “Se somos da mesma cultura, podemos tocar a mesma música se pusermos as lembranças a funcionar”, sustenta Mário Lúcio a propósito dos artistas convidados que são nitidamente «encaixados» na estética Simentera. A ideia de Mário Lúcio é a de que “não há um destaque a quem quer que seja. O Manu Dibango toca connosco, como se fosse um saxofonista dos Simentera”.
Conforme é possível constatar no título do disco, a história universal tirou (“Tr’) e acrescentou (“adicional”) valores à cultura de Cabo Verde. Apesar do flagelo social que constituiu a escravatura e que roubou à terra um sem-número de gente, a música foi a grande beneficiada com esta miscigenação triangular entre África, Europa e América. “Fomos ao encontro de uma parte da nossa cultura. Ao trazermos um camaronês, estamos a ir buscar, não só um convidado especial, mas uma parte das nossas raízes. Apesar de fazermos música em estilos diferentes, as raízes da Maria João e do Mário Laginha são comuns às nossas. O Paulinho da Viola faz parte da nossa identidade. O Brasil tem muita influência na música de Cabo Verde. Ajuda a nossa música a desenvolver-se. É uma referência muito actual”.
”A VIDA COMO UM TODO”. Todos os músicos dos Simentera vivem e trabalham em Cabo Verde, em áreas de elite: da medicina, à advocacia. Os seus membros não conseguem dedicar-se em exclusivo à música que executam e que recolhem em todo o arquipélago. Mas o porta-voz do grupo recusa que esta actividade musical seja secundária. “É paralela e é também um ganha-pão”, revela. “Assumimos a vida como um todo. As oito horas de trabalho diário, a actividade dos Simentera, o tempo para estar com a família e o trabalho comunitário local”.
O ESTATUTO DE MÚSICO INTERNACIONAL. Ao longo de quase uma década de trabalho, alguns elementos dos Simentera têm sido prejudicados por manterem esta actividade criativa, tendo maiores dificuldades em progredir na sua carreira pública, uma vez que o grupo tem-se, por razões das várias digressões, têm-se ausentado do arquipélago por períodos de um ou dois meses. Antes de partirem, visitam o Ministro da Cultura e o Primeiro Ministro que alertam os serviços em que os músicos exercem funções para serem mais flexíveis com a justificação das faltas. No entanto, esta é uma luta que os Simentera travam há oito ou nove anos e que “ainda não foi conquistada”, sustenta. “Lutamos para que haja uma legislação que favoreça o estatuto de músico internacional. Este, tal como um atleta, também é um embaixador do seu país e deve ser reconhecido como tal”, afirma Mário Lúcio. Ele apenas pretende que “o músico de projecção internacional que tem de sair do país no âmbito do seu trabalho artístico, não deverá ter de pedir autorização ao seu serviço para se ausentar. Bastaria comunicar atempadamente a sua ausência com um prazo de tempo estabelecido”. Apesar de tudo, os Simentera tem tido “quase sempre a colaboração do governo, seja este de esquerda ou de direita”. Só que, ainda não foi publicada uma legislação que lhes confira o estatuto pretendido.
‘Tr’adicional’ é uma edição da francesa Melodie. É distribuído em Portugal pela Megamúsica.
Olha uns que eu gostava muito de ver e ouvir. Mas dia 4 de Junho e não de Julho Luis :-). Lé há uns tempos que se juntaram para ajudar um deles que estava com problemas de saúde. Sabes se vai saír daí disquinho?
Obrigado pelo reparo, Amália. Era bom se saísse novo disquinho, era. Essa é uma questão que tem de ser colocada quando eles estiverem por cá. bjs
Caro Rei, como está? Tudo bom? Espero que sim.
Olha, daqui deste lado escreve a Maria de Sousa, elemento do Grupo.
Olha, para a tua/vossa informação -quanto à possibilidade de sair mais um discozinho- olha, quem sabe, quem sabe !! Haja vida e saúde para nós todos, nos aguarde!! Olha em Serpa o Encontro foi muito bom e, te digo que todos adoramos esse Município. As pessoas então… vou-te contar hein. Gente boa, simpática. Havemos de voltar lá um dia, se Deus quizer !
Cumprimentos à Amália.
Abraço amigo.