Entrevistas

LHASA: um dos regressos mais ansiados.

S�o pequenas not�cias como esta que nos alegram o dia. O Rui Silva, do Forum Sons e leitor regular deste blogue, postou aqui a cr�tica ao disco que marca um dos regressos mais ansiados: o da autora do admir�vel �lbum �La Lhorona�. N�o resisto a repescar a entrevista que fiz a esta canadiana errante, h� cerca de cinco anos atr�s e que estava postado no velhinho site das Cr�nicas da Terra.

L�grimas de crocodilo

Filha de um escritor mexicano e de uma fot�grafa e antiga actriz americana, Lhasa de Sela nasceu nos Estados Unidos. Durante a adolesc�ncia percorreu o seu pa�s costa a costa e viveu no M�xico. Aos 25 anos, com resid�ncia fixa em Montreal, Lhasa editou um dos mais belos e melanc�licos �lbuns deste ano. “La Lhorona”, figura m�tica dos Astecas seduz os homens aos primeiros acordes de uma can��o triste, para os beijar e tranformar em pedra. Um enredo que d� o mote � m�sica triste, intensa e dram�tica que Lhasa e Yves Desriosiers arquitectam.

Que tipo de influ�ncia os teus pais tiveram na tua carreira?

Eles exerceram uma grande influ�ncia. Como estivemos muito tempo em viagem, n�o ia � escola. Eles foram os meus professores, habituaram-me a n�o ver televis�o e a ler todo o tipo de literatura. A minha m�e ouvia habitualmente m�sica muito triste que eu tamb�m adorava. O meu pai � professor de espanhol, por isso mesmo quando escrevo as minhas can��es e entro na fase de bloqueio, n�o sei o que escrever, telefono-lhe e ele conta-me hist�rias e declama poemas para eu ter ideias.

Penso que deves ter tido problemas de integra��o durante a inf�ncia. Por um lado viajavas constantemente, por outro n�o vias televis�o e ouvias m�sica que os mi�dos da tua idade n�o estavam habituados. N�o te consideravam uma rapariga estranha?

Sim. Era uma rapariga muito solit�ria. Quando entrei na escola, tinha doze ou treze anos e foi muito dif�cil para mim. Era muito t�mida, tinha medo das pessoas. Andava sempre sozinha, encostada a um canto.

As viagens que fizeste pelos Estados Unidos e M�xico influenciaram algumas can��es deste �lbum?

Sim. Crescer da forma que cresci, faz-me sentir que a vida � uma aventura, cheira de magia e mist�rio. S�o estes os sentimentos que eu tento expressar atrav�s da minha m�sica.

Disseste que o canto representa para ti uma forma de estares consciente das tuas emo��es e rires-te delas. � dif�cil lidares com tais emo��es?

Sim. Porque era uma rapariga muito calada e t�mida, e o cantar permite-me p�r c� para fora emo��es que eu desconhecia. Quando eu canto posso sentir toda a tristeza, melancolia e raiva. Com a m�sica, tento fazer algo de bonito. Quero que toda essa tristeza e raiva sejam belas e que n�o sejam apenas uma forma de expressar emo��es de uma forma criativa.

Para ti o belo n�o faz sentido sem sofrimento?

Tu tens a sombra e a luz e eu penso que a m�sica � a combina��o das duas. Apenas luz n�o tem sentido para mim. Mas se for apenas sombra � demasiado escuro, n�o consegues ver nada. Precisas de luz e sombra, precisas do contraste de tristeza e esperan�a, amor e raiva. � isso que faz com que a minha m�sica seja dram�tica, bonita. Esse conflito est� sempre presente na minha vida. Por muito que queira caminhar para a luz, tenho de passar pela escurid�o para chegar � luz.
Penso que este �lbum � como um filme mexicano dos anos 40, com uma produ��o moderna. Mas � um filme que conta apenas uma parte da tua vida.

Como ser� a “sequela”?

N�o sei, mas penso que ser� diferente. Menos triste, mais extrovertido. Penso que nos �ltimos anos absorvi muito estas can��es tristes e agora quero fazer algo diferente. � verdade que a ideia de fazer cinema com a m�sica � uma realidade. O Yves (guitarrista) escreve comigo as can��es e traz a tal qualidade cinem�tica. Mas ele tamb�m mudou um pouco. N�o sei o que vir�. Vamos fazer muitos espect�culos at� Maio, e depois pretendo efectuar uma pausa para escrever.

“La Llorona” � um disco de m�ltiplas refer�ncias. Riacheras mexicanas, temperos klezmer, m�sica de cabaret. Como acontece todo este ecletismo?

Oi�o m�sica todo o tempo. Sou uma fan�tica. N�o � nada que decida, acontece porque quando estamos a compor dizemos isso � bom, e pode soar a m�sica grega, klezmer, ou o que seja.

Muitos jornalistas referem que o facto de cantares em espanhol � uma desvantagem. Mas esta n�o � a forma que te permite dar maior expressividade �s tuas emo��es?

Sim. Eu nunca quis ser uma estrela pop. Queria fazer m�sica do fundo do meu cora��o. A carreira art�stica � importante, mas para mim a minha vida tem ainda mais valor. Quero ser verdadeira para comigo. Sen�o sou apenas uma oper�ria da m�sica.

Cantar em espanhol n�o ser� tamb�m uma quest�o de estilo?

N�o sei. O espanhol inspira-me. � tamb�m uma quest�o de estilo. Quanto canto em espanhol tenho uma voz diferente. Gosto de cantar em muitas l�nguas. Gosto de cantar em ingl�s, em franc�s, canto tamb�m em italiano, russo e um pouquinho de portugu�s. Gosto de cantar em l�nguas diferentes, porque cada uma tem uma cor e um feeling pr�prio. Quando fiz este �lbum, senti-me inspirada pela forma como o espanhol me permitia ampliar a tristeza.

Tens uma verdadeira alma cigana. � dif�cil lidar com tantas restri��es de hor�rios a que agora est�s submetida?

H� uma parte de mim que se sente como um c�ozinho, saltando no circo. A� sou muito obediente. Mas por vezes sinto que queria ser um le�o, n�o ter de obedecer a ningu�m. Por�m, quando estou no palco, a magia paira no ar e sinto-me livre.
� uma vida dif�cil. Tens de fazer muitas coisas que n�o gostas. Mas quando est�s l� em cima esqueces tudo isso.

Para ti o palco � um local m�gico. Mas para sentires essa magia precisas de ter um p�blico que te compreenda. Certo?

Quando as coisas correm bem, liberto-me, sinto-me muito pr�ximo da audi�ncia e penso que estamos a ter um sonho em conjunto. Sa�mos da realidade e criamos um mundo pr�prio, cheio de coisas misteriosas a acontecer.

� muito dif�cil lidar com diferentes audi�ncias de diferentes pa�ses?

Nem sempre a magia acontece. Depende do tipo de concerto que fazemos, se � num festival onde n�o nos conhecem, ou num teatro em que somos cabe�as de cartaz e as pessoas sabem ao que v�o. Por exemplo, nos Estados Unidos s� uma �nfima minoria compreende a minha m�sica. Mas quando estive na Ilha Reuni�o e fiz a primeira parte da Ces�ria �vora, senti uma coisa incr�vel. Um momento m�gico. Estava t�o longe de casa, sentia-me nervosa, mas o entendimento entre mim e o p�blico foi fant�stico. � por isso que eu digo que a vida � uma aventura.

Jornalistas americanos afirmaram que eras a sua resposta ind�gena � Ces�ria �vora. Concordas com a compara��o?

Gosto muito da m�sica dela, j� a vi tr�s vezes ao vivo, mas penso que h� muitas diferen�as. Uma � que ela n�o escreve can��es e canta apenas as tradicionais de Cabo Verde, outra � que ela � muito calma em palco. Eu sou muito emocional, com o nervo � flor da pele. A m�sica dela pode tamb�m ser melanc�lica, mas � mais doce, mais suave.

Tens planos para tocar em Portugal?

Talvez na pr�xima Primavera. Estamos a planear tocar em Espanha e Portugal durante Mar�o ou Abril. (NR: entrevista efectuada por telefone em Janeiro de 98).

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