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Auto da Fonte dos Amores: o romance de Pedro e Inês como nunca ouviram

A mui nobre editora discográfica minhota Tradisom de José Moças que tem editado, ao longo de mais de uma década, verdadeiras obras fundamentais (e imprescindíveis peças de colecção) do nosso cancioneiro popular rural e urbano, publicou recentemente o livro / fonograma da ópera popular “Auto da Fonte dos Amores” de Carlos Clara Gomes, em que participaram mais de uma centena de músicos / cantores. O luxuoso livro (como é hábito) inclui belíssimas ilustrações de Pedro Sousa Pereira.

«Auto da Fonte dos Amores, de Carlos Clara Gomes (autor do libreto e da música, assinando também a produção), é uma história em formato de ópera popular que transporta a paixão de Pedro e Inês desde o seu entorno medieval até aos nossos dias.

Trata‐se dum episódio que frutificou de forma muito ampla no imaginário popular mundial: Em Itália há cerca de 350 dramaturgias baseadas nesta estória, sendo também registadas releituras da paixão dos amantes lusos em França (uma das primeiras peças de Victor Hugo é justamente sobre este tema), Espanha, Escócia e Argentina, entre outros países.

Este trabalho foi gravado em 2005 (nos 650 anos da Morte de Inês de Castro) nos Estúdios da Universidade de Aveiro e que contou com 82 intérpretes vocais e 33 instrumentistas. Feito com sede nas músicas populares do mundo, a solicitação da dramaturgia, entrecruzam‐se neste trabalho diversos géneros e estilos: Tango, Fado, Soul Music, Morna, Chula, Mambo, Tumbao, Rock, HipHop, Pantonalismo e Minimalismo.

Ainda no que concerne à componente musical, este trabalho contou com a prestação de importantes nomes da música portuguesa (e galega, no caso de Uxía, no papel da também galega Inês de Castro). João Afonso interpreta Pedro. Manuel Freire dá voz ao Peregrino; Sérgio Godinho e Carlos Clara Gomes protagonizam os dois menestréis – bloggers da época –; João Maria Pinto, Aurélio Malva e Sebastião Antunes interpretam os três fidalgos Diogo Lopes Pacheco, Pêro Coelho e Álvaro Gonçalves. José Medeiros incorpora o rei Afonso IV; Ana Celeste Ferreira, no papel de Bruxa, João Ricardo, no papel do Bispo de Braga e ainda Carlos Fragateiro que fecha as participações vocais interpretando o Mestre de Avis. Muitos outros cantores participam neste trabalho – com destaque especial para os ensembles vocais Bocas do Povo, Segue‐me à Capela, Infantuna Cidade de Viseu e Companhia DeMente.

Participaram ainda muitos outros músicos e actores, realçando a participação do pianista e compositor argentino Daniel Schvetz (que também colaborou com o autor na revisão da partitura), os uruguaios Daniel «Tato» Moraes (Guitarra) e Mauro Pérez (piano eléctrico) e o argentino Walter Hidalgo (bandoneon). A percussão e bateria foram interpretadas por Joaquim Teles (Quim Né) que também concebeu os arranjos das respectivas partes.

Acima de tudo, importa referir também a pertinácia deste trabalho nos dias de hoje – para lá da mera visitação de pretexto historiográfico – em que se patenteia claramente a intemporalidade do(s) Poder(es). Sim, porque, a coberto da pudica mantilha moralizante e empoeirada que foi contada nos bancos da escola a uma grande parte dos portugueses, desponta, furtiva, a verdadeira razão da morte de Inês: uma questão política visando garantir que o Trono português não tombaria em mãos castelhanas pela via galega.

É também uma dissecção da já muito usada prática da demagogia porquanto se manipulou a «opinião pública» para legitimar a sentença de morte proferida no Castelo de Montemor. O resto… desde o arrancar de corações a dois dos fidalgos, algozes de Inês, depois de os forçar ao beija‐mão do cadáver da galega até à faraónica construção da necrópole real de Alcobaça, patenteando um sadismo aprimorado, tudo isso se inscreve naquele corredor onde as sombras do Mito mancham a luz da História (ou vice‐versa?).

A Tradisom World Music lança este livro/fonograma de Carlos Clara Gomes (com belíssimas ilustrações de Pedro Sousa Pereira), no âmbito dos 650 anos da trasladação de Inês de Castro (de Coimbra para Alcobaça) e também no âmbito dos 40 anos de carreira do autor deste trabalho.»

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