“- Está a ser bom, não foi?”. Poderia ser este o mote do Festival Med, versão 2012, de apenas dois dias de celebração da música em que as “antenas” têm ganho cada vez mais terreno às “raízes”. Apesar de alguma perda de identidade da matriz mediterrânica e atlântica (da Europa, às Américas e África), ambas as noites registaram casa cheia.
Este foi um festival Med de combate, com um orçamento reduzido a cerca de 50%, mas nem por isso menos interessante. O público encheu como sempre as estreitas ruas do centro histórico de Loulé. Sabia, muitas vezes, ao que ia (isso sentiu-se nas Jamaican Legends). Houve um corte significativo de gordura e proteina no menu (a nossa saúde obriga a que abdiquemos de refeições tipo rodízio de carnes e nos foquemos mais num mini-prato de legumes e cereais), sobretudo nos palcos da bica e do arco que deixaram de apresentar espectáculos a meio da noite.
A excelência da Cerca e da Matriz
Foram, igualmente, duas noites bem mais calmas, com menos correria de palco para palco (e, uma vez mais, amigas do coração), em que não houve necessidade de abdicar de um dos concertos da Matriz ou da Cerca (apenas dos do Castelo), como no passado recente, em que para usufruir de mais uns minutos da raça de Lura, perdi o transe de Justin Adams e Juldeh Camara.
Como sempre, viveram-se momentos de excelência, nos palcos da Matriz e da Cerca. A estreia do projecto que une o Brasil de Arnaldo Antunes e Edgard Scandurra com o Mali de Toumani Diabaté revelou uma certa falta de entrosamento de pré-época, de ínicio de digressão, mas um enorme potencial de estarmos perante uma espécie de Afrocubism II (neste caso “Afrobrasileirism”).
Os espíritos do Rio Niger parecem ter visitado durante estes dois dias a Ria Formosa, tal a carga espiritual que emanava da música dos também malianos Boubacar Traoré e SMOD e do senegalês Cheikh Lô (membro da irmandade islâmica Baye Fall).
As Jamaican Legends de Sly & Robbie, Ernest Ranglin e Monty Alexander cumpriram a tradição de oferecer o habitual concerto transcendental que capaz de rebentar pelas costuras o curto espaço do largo da Matriz. Foi assim, em outros anos, com Buena Vista Social Club, Goran Bregovic e Afrocubism. Momentos memoráveis que o tempo não apaga da nossa memória.
Ainda na Matriz, começa a ser tradição a apresentação de um DJ com estofo suficiente para substituir uma banda em palco. Se, em anos anteriores, tivemos a extravagância balcânica de DJ Click com músicos e dançarinas ciganas, a alegria e pureza contagiante de DJ Mpula com o seu projecto Batida, este ano coube-nos na rifa Sany Pitbull. O homem é, de facto, um monstro na forma como controla uma plateia, como brinca a todo o momento com a maquinaria (que enorme técnica), exercitando batidas de baile funk… mas o que é que é isso de misturar Michel Teló, como Oasis, Nirvana e Red Hot Chili Peppers? O que é que é isso de ouvir a turba embevecida a entoar em êxtase o refrão de “Ai se eu te pego”?
A expressão “world music” pode possuir um certo cariz apátrida, ninguém sabe muito bem quais as fronteiras que a definem (porque se trata exactamente de músicas sem fronteiras), mas não exageremos.
As heresias do Med
Longe vão os tempos em que o Festival Med era um balcão mediterrânico que cometeu a saudável heresia de convidar os escoceses Capercaillie.
Longe vão os tempos em que o palco do Castelo era uma espécie de vitrina de novos talentos nacionais da folk e da “world” produzida no nosso país, como Dazkarieh, Diabo a Sete, Mu, Mandrágora, Olivetreedance, Galandum Galundaina, etc.
Mudam-se os tempos, baralham-se as vontades. No Castelo (e agora também na Cerca) o rock e o pop com direito a airplay nas principais emissoras ganha cada vez mais ascensão sobre projectos semelhantes aos acima referidos. Conquistam-se novos públicos (que acham que Boubacar Traoré não se enquadra no espírito deste festival e que, por isso, enchem por completo a zona das barracas de cerveja e da roulote dos cachorros), perde-se uma certa identidade. Por isso mesmo, ansiamos saber qual o rumo que o Med irá tomar nos tempos mais próximos.
[continua]
(c) Fotos: CM Loulé
Um DJ a passar Oasis, Nirvana e Red Hot Chilli Peppers! e
Um DJ a passar Oasis, Nirvana e Red Hot Chilli Peppers????? E a fazer entoar o “ai se eu te pego”????????? No que se está a transformar o MED????
Não é piada de certeza??
Olá Joe, foi o que vi / ouvi durante 15 minutos. Tecnicamente é irrepreensível. E contou com o espaço da Matriz a abarrotar (com se estivessem para ver Goran, Buena Vista ou Jamaican Legends). Penso que o Vibe ou o Jiggy também seriam tão bem (ou melhor) sucedidos como ele. Resta saber se um nome desta natureza se enquadrava ou não no espírito do festival. Mas, pelo que me apercebi, boa parte da audiência deve preferir uma hora de m80’s, house, tecno e sucedâneos do que um Gaetano Fabri ou uns Shazalakazoo. O que é pena… Noutro campeonato, no palco “terciario” do Castelo, o Dj de Reggae e o Clube Conguito deram boa conta do recado.
Luís, quero lá saber da técnica irrepreensível e de malabarismos de circo, um DJ que passa Oasis e co. e o ai se eu te pego (que até a minha sobrinha de 3 anos passa a vida a cantarolar) num festival de world music conceituado e com um passado ilustre, é um DJ que não merece da minha parte o mínimo respeito artístico, um DJ que deve tar na moda para adolescentes alienados! Isto até dá vontade de rir mas a culpa nem é dele, coitado, pobre pateta, mas sim de quem o leva lá e se calhar com um cachet astronómico, para pôr as pessoas a cantar o ai se eu te pego! Isto até parece piada, uma piada de mau gosto!