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“Armada” portuguesa conquista México

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MARENOSTRUM

GALANDUM GALUNDAINA, DAZKARIEH, MARENOSTRUM, MUSICALBI, MANUEL OLIVEIRA, LUMEN, MARGARIDA GUERREIRO e o projecto de poesia A MUSA AO ESPELHO (de JOSÉ CARLOS TINOCO) participam na semana portuguesa da quarta edição do Festival mexicano Ollin Kan, que se realiza entre 26 de Abril e 20 de Maio, na Cidade do México. Este é um mega-festival, ao nível daqueles que se realizam em países mais abastados (Europa do Norte), “das culturas em resistência” que, em 22 dias, apresentará 72 grupos internacionais, 37 nacionais que irão efectuar mais de duas centenas de espectáculos de rock, rap, flamenco, folk “celta”, son cubano, rumba, salsa, calypso, música mandinga, bossanova, tango, etc, em mais de uma dezenas de palcos / espaços tão díspares quanto auditórios em fóruns culturais, esplanadas, bosques, parques ecológicos, complexos desportivos, etc. Carlos Bartilloti, produtor e agente sediado em Matosinhos, responsável pela selecção dos projectos nacionais que partem para o México no início de Maio, responde a algumas perguntas formuladas pelas Crónicas da Terra.

Como é que um país como o México consegue produzir um festival com esta dimensão, ao nível de um evento organizado por um dos mais ricos países do mundo?

Eu penso que a razão do sucesso e da grande dimensão deste Festival tem muito a ver com a pessoa do seu director, José Luís Cruz e da sua equipa. O lema do José Luís Cruz é que “se acham que é impossível nós fazemos”. Há nesta equipa uma postura de audácia, de uma certa ” loucura saudável ” que lhes tem permitido vencer os obstáculos do orçamento, da multiplicidade de grupos e de nacionalidades, problemas inerentes à burocracia de emissão de vistos de entrada, logística, etc. Há que ousar sonhar e eles sonharam. Têm um enorme entusiasmo, acreditam profundamente no projecto e neles próprios e transmitem isso, contagiando-nos a todos nós, participantes, a embarcar nesta aventura.

A que se deve o interesse de José Luís Cruz na música portuguesa? Afinal este festival intitula-se de “culturas em resistência”. Parece tratar-se de um evento de povos indígenas ou de culturas ameaçadas. Estará a cultura portuguesa ameaçada?

Há dois anos conheci o José Luís Cruz, director do Festival Ollinkan, na edição da Womex em Essen. Entreguei-lhe o porte fólio das bandas que represento e os GALANDUM GALUNDAINA foram convidados a participar no Festival. Devo dizer que considerei que este programador teve uma precisão cirúrgica na escolha do grupo. Fazia todo o sentido. Se pode haver um povo e uma cultura em resistência em Portugal, esse é certamente o povo mirandês. Com o tempo desenvolvemos uma forte amizade e, em 2006, na Womex de Sevilha, convidei o José Luís Cruz a visitar Portugal e dei-lhe a conhecer o País e um pouco da nossa cultura, principalmente a música portuguesa que eu considero mais significativa. A cultura portuguesa, pode estar ameaçada por uma globalização que promova a massificação. É neste contexto que se insere a participação de Portugal através de uma representação de grupos que apresentam um som próprio de carácter único. Quando participamos no Festival Ollinkan de 2005, constatei uma certa filosofia de programação mais inclinada para o étnico e para as raízes dos povos. Assim, considerei que estes grupos apresentam projectos originais e que de certa forma se inserem no espírito e filosofia do Festival, para além da qualidade inegável do seu trabalho. Quis também com esta programação apresentar uma panorâmica alargada do que se faz e actualmente em Portugal.

É verdade que as bandas vão ao México pagando o seu próprio bilhete de avião (que acaba por ser pago pelo cachet que irão ganhar)? Qual é a motivação para estes músicos que têm de suportar esta despesa?

As bandas não pagam o seu próprio bilhete de avião. O Festival Ollinkan paga as viagens e envia os bilhetes para Portugal e depois esse valor é descontado no cachet que vão receber. Ninguém vai pagar para ir lá tocar… As refeições e o alojamento em hotel de 4 estrelas e os transportes internos são assegurados pela organização e do cachet ainda sobra algum dinheiro para os grupos. Existem várias vantagens e motivações para os grupos se deslocarem ao México:
1 – Internacionalização dos grupos musicais portugueses;
2 – Prestígio e legitimação artística por terem sido escolhidos para este importante Festival;
3 – Novas experiências e intercâmbio de ideias e projectos com artistas de várias partes do mundo;
4 – Estabelecimento de contactos e construção de redes artísticas;
5 – Difusão e apresentação da sua obra a muitos milhares de pessoas. Convém recordar que a cidade do México tem 20 milhões de pessoas e que a dimensão e escala não tem nada a ver com a nossa realidade;
6 – Possibilidade de se venderem umas centenas de discos de cada grupo, que vai constituir outra importante receita para as bandas.

Quando é que teremos uma entidade estatal que apoie grupos musicais portugueses que vão lá fora divulgar a nossa cultura?

Se estivéssemos a contar com isso nunca sairíamos daqui. Eu penso que o nosso Ministério da Cultura tem uma visão e uma opção profundamente errada quanto aos apoios à internacionalização dos projectos culturais portugueses. Ainda não perceberam que não promovem absolutamente nada a cultura portuguesa apresentando artes plásticas ou dança contemporânea. Essas expressões inserem-se precisamente na enorme massa indistinta da globalização cultural que não permite distinguir a origem dos projectos, se quiseres, sem DNA português. Para o público, tanto podem ser portuguesas, como americanas ou francesas.
O provincianismo e a pequena visão do Ministério da Cultura levam ao esgotamento das já reduzidas verbas em participações como as Bienais de S. Paulo e de Veneza para, em bicos de pés, quererem mostrar que em Portugal também conseguem fazer o que se faz lá fora. Enfim…talvez um dia percebam que o apoio à música portuguesa e a sua inserção nos movimentos do que se convencionou chamar World Music, constitui a maior e a mais eficaz promoção e difusão da cultura portuguesa.

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5 Comments

  1. É bom que a música portuguesa se internacionalize (e não só a música tradicional). Da mesma forma, é bom que as artes portuguesas se internacionalizem (e não só a música). Dito isto, não deve esperar-se muito do Ministério da Cultura, que não está vocacionado para este tipo de apoios. Os apoios pontuais, que têm sido dados pelo Ministério, contemplaram, normalmente, projectos já consagrados (Carlos Paredes, Madredeus, Mariza, etc.) que geram consensos. A música tradicional, é uma música marginal e, por isso, pouco apoiada. A instituição vocacionada para este tipo de apoios é o ICEP (em vias de fusão com outros institutos). É altura dos interessados se organizarem com vista à defesa e promoção da música portuguesa no estrangeiro. Para isso, foi recentemente criada a Associação de Promotores da Música de Portugal (APMP), mais conhecida por “MUSICA PT”. Aceitam-se membros!

  2. Olá Rui,

    Acho que nunca houve tantos projectos a irem lá fora como actualmente. E já não estamos a falar de (apenas e só) gente ligada ao fado. Ao nível das bandas folk é notável verificarmos a ascenção dos Dazkarieh. É sinal que não vão ao WOMEX de férias, vão para trabalhar. Toda esta conjuntura é boa para os novos grupos e deve ser aproveitada por estes. Só é preciso que haja maior capacidade de organização de certas bandas e que invistam a 100% na carreira. Festivais, programadores e público atento não falta por essa europa fora…
    É importante concentrar (e agir concertadamente) todos os esforços individuais das bandas, dos promotores, do “Musa Lusa”, do Atlantic Waves, do Musica.pt para que possamos ver com maior regularidade música portuguesa além fado.

    abraço

    lr

  3. Só é pena, que haja alguns programadores portugueses que não consigam ver e principalmente ouvir 🙂
    Continua-se a assistir ao tipico comportamento pseudo-intelectual, com programações unicamente alicerçadas nas opiniões das revistas internacionais do género ,ou na leitura marrona de algum volume dos rough-guides,….talvez consultando páginas electronicas de outros festivais do género……..

    E só nos lembra , conceitos desfigurados e falta de essencia, o que é a folk ?, o que é a world ?, e a subserviencia às leis do mercado da musica, aos artistas fabricados……….

    Actualmente são muitos os grupos tocam bastante fora de portugal , mas não sao reconhecidos pelo seu trabalho no pais onde começaram……é uma casa portuguesa..com certeza !!!

  4. Olá Vasco,

    Há de facto alguma resistência em relação a músicos portugueses em certos festivais que têm de pôr o pessoal a pular e a saltar, mas também é verdade que muitas vezes os músicos portugueses têm dificuldade em dar-se a conhecer. Por exemplo, quantas bandas é que enviam anualmente uma proposta para fazer um showcase no WOMEX? Quantas bandas é que se candidataram à rede galega de música ao vivo? Mas há, de facto, muita “matéria-prima” em Portugal que merecia ser melhor aproveitada. Gostava de ver, por exemplo, Tora tora big band, Kumpania Algazarra, O’questrada, Anónima Nuvolari, Cacique 97, Melech Mechaya em Sines ou em Loulé.

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